3.2 BRASIL SURDO, trechos selecionados de Música de Invenção

(fragmentos sobre o desinteresse brasileiro frente aos músicos inventores)

“Sobre Webern, cuja grandeza paira acima de quaisquer ignóbeis e retrógradas tentativas de vilificação, escreveu Boulez, em 1961: “Webern permanece o limiar da música-nova: todos os compositores que não o experimentaram profundame e não compreenderam a inelutável necessidade de Webern são perfeitamente inúteis”.
augusto de campos
(CAMPOS:2007, p32)


Artigo: O testamento de ezra pound: uma antiÓPERA
Música de Invenção: pág 27-32 (originalmente publicado em Folha de S, Paulo,
Folhetim n.340, 24/07/1983 – fragmentos presente nesse trabalho, cick aqui)
(...)
 Infelizmente, não nos restas outra alternativa. Um dos sintomas da miséria intelectual a que este país foi lançado, entre outras misérias, são as dificuldades crescentes para se estar ou manter culturalmente informado. A música – e me refiro em particular à de índole culta ou erudita – é uma das áreas mais desprotegidas e mais severamente castigadas pela desinformação e pela grosseria dos veículos de comunicação. Pode-se mesmo asseverar, sem exagero, que o Brasil é um dos países mais atrasados do mundo em matéria de informação musical.

Artigo: Smetak, para Quem Souber
Música de Invenção: pág 85-89 (originalmente publicado na revista SomTrês, n.22, outubro de 1980)
(...)
Eis aí um fato auspicioso. No rico e diferenciado panorama da música brasileira há muito espaço para a canção popular, pouco espaço para a múscia (instrumental) popular e quase nenhum para a música impopular, também chamada erudita, em especial a contemporânea, condenada, na maior parte ao descaso editorial.
    Há inegavelmente, uma distorção cultural entre nós. Conhecem-se, prestigiam-se e editam-se os melhores da música popular, daqui e de fora, com uma ou outra omissão. Mas atinge dimensões apocalípticas a falta de gravações de música do nosso tempo, não ligada ao setor do entertainement, isto é, aquela que não tenha apenas a função de divertir e fazer passar o tempo, mas que envolva um aprofundamento em nossa sensibilidade e uma ampliação do nosso conhecimento: que demande, como resposta, não apenas balanço hipnótico dos quadris, mas dança do intecto, chispa e cirulação do mais humano dos atributos do animal chamado homem: o cérebro. (...)

Artigo: VIVA WEBERN
Música de Invenção: pág 105-111 ( originalmente publicado em Folha de S, Paulo,
Folhetim n.359, 04/12/1983 – fragmentos presente nesse trabalho, cick aqui )
(...)
No Brasil sem Webern, no Brasil de macunaísmos sem caráter, onde desmemoriados aprendizes de patrulheiro ensaiam um tardonho e mal disfarçado retorno a Jdanov (atualmente [[artigo escrito em 1983]] oculto entre nós sob o codinome de Hanns Eisler, hinista oficial da Alemanha Oriental substalinista), a música erudita continua sendo a mais atrasada de todas as artes. E é da música popular, tão maltratada pela inveja obscura e pelas mesquinharias sinistro-elitistas, é da música independente, sem hierarquias e sem patrulhas, que continuam a surgir, apesar de tudo, a voz do povo (não populista nem popularesca) e a voz do novo.

Artigo: VIVA VARÈSE
Música de Invenção: pág 113-122 (originalmente publicado em Folha de S, Paulo,
Folhetim n.361, 18/12/1983 – fragmentos presente nesse trabalho, cick aqui)
        (...)
Como a de Webern, a música de Varèse quase não tem chegado ao Brasil. É lamentável. Seu projeto [[Varèse]] percussivo e pré-eletrônico tem muito a ver com a nossa experiência musical, da tradição afro-brasileira ao popular urbano. Ele não admirava as batucadas? Frank Zappa o homenageou mais de uma vez, mostrando que a música popular da era pós-eletrônica tem plenas condições de assimilá-lo. Aqui, quando a inquisição e a demagogia populistas dão animados passos no seio da música erudita, urge um banho de Varèse, o insubordinável operário dos sons organizados, para ressucitar em nossos músicos o caráter e a coragem dos que se recusam a morrer.

Artigo: O PROFETA E GUERRILHEIRO DA ARTE INTERDISCIPLINAR
Música de Invenção: pág 133-135 (originalmente publicado na Folha de S, Paulo, 05/09/1982
– fragmentos presente nesse trabalho, cick aqui)

Neste ano [[artigo escrito em 1982]] em que Cage, septuagenário, mas mais jovem do que todos nós, foi homenageado com um concerto de 13 horas no Symphony Space, e com uma exposição de obras gráficas, Partituras e Impressos, no Whitney Museum, de Nova York, o Brasil continua sem esperança de poder corresponder aos votos-lema do compositor: HAPPY NEW EARS (trocadilho irreproduzível entre YEARS, anos, e EARS, ouvidos). Ou em canibalês brasileiro: OUVIDOS NOVOS PARA OS ANOS NOVOS. Uma surdez informativa que nos deixa lamentavelmente, pelo menos quarenta anos atrasados.

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